quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Olhos para ver o que não pode ser visto



Quando vejo a neve, eu me lembro de um poema. Ele se chama “Neve que cai”, de Misuzu Kaneko, uma jovem que partiu deste mundo com 26 anos.

A neve do alto
Que frio que ela deve sentir!
Pois o luar cai gélido sobre ela

A neve de baixo
Que peso que ela deve sentir!
Pois centenas de pessoas pisam nela

A neve do meio
Que solidão que ela deve sentir!
Pois não consegue ver nem o céu nem o chão

Como uma pessoa consegue ter uma sensibilidade tão grande para descrever os sentimentos da neve? (...) Misuzu aniquilou totalmente o seu ego, tornando-se uma com a neve e sentindo com ela o frio, suportando com ela o peso das pessoas e chorando com ela por causa da solidão

Existe outro poema de Misuzu Kaneko chamado “Pesca Farta”.

É alvorada, o sol está raiando
E a pesca é farta
Muitas sardinhas grandes
Caindo na rede

A praia toda
Está em festa
Mas nas águas do mar
São rezadas missas pelos espíritos
Das milhares de sardinhas pescadas pelos humanos

É possível até visualizar Misuzu chorando ao ouvir o pranto das sardinhas, enquanto observa as pessoas explodindo de alegria pela pesca farta.

Misuzu Kaneko faleceu muito jovem, com 26 anos.

Acredito que ela tinha olhos para ver o que não pode ser visto e ouvidos para ouvir que não pode ser ouvido.

Shundo Aoyama Roshi
(em “A Coisa Mais Preciosa da Vida”)


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