segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Ao viajar nos livramos de nós


Não creio ser verdade o que dizem, que ao viajar alguém possa se transformar em outra pessoa: o que acontece é que nos livramos de nós mesmos, de nossas obrigações e nosso passado, tal como reduzimos tudo o que possuimos aos poucos objetos necessários que vão dentro da mala. A parte mais pesada de nossa identidade sustenta-se sobre o que os outros pensam e sabem sobre nós. Olham-nos e sabemos que sabem, e no silêncio forçam-nos a ser o que esperam que sejamos.

Antonio Muñoz Molina

domingo, 30 de dezembro de 2012

Renúncia

Se existe o desespero, é porque ainda existe um "eu" que se desespera, que se deleita na dor e que se leva muito a sério. Se renuncio a este eu, renuncio, ao mesmo tempo, ao desespero.

Jean-Yves Leloup
(em "O Absurdo e a Graça")


sábado, 29 de dezembro de 2012

Quero saber se podes


Não me interessa saber o que fazes para ganhar a vida. Quero saber o que desejas ardentemente, se ousas sonhar em atender aquilo pelo qual o teu coração anseia. Não me interessa saber a tua idade. Quero saber se arriscarás parecer um tolo por amor, por sonhos, pela aventura de estar vivo. Não me interessa saber que planetas estão em quadratura com a tua lua. Quero saber se tocaste o âmago da tua dor, se as traições da vida te abriram ou se te tornaste murcho e fechado por medo de mais dor! Quero saber se podes suportar a dor, minha ou tua; sem procurar escondê-la, reprimi-la ou narcotizá-la. Quero saber se podes aceitar alegria, minha ou tua, se podes dançar com abandono e deixar que o êxtase te domine até às pontas dos dedos das mãos e dos pés, sem nos dizeres para termos cautela, sermos realistas, ou nos lembrarmos das limitações de sermos humanos. Não me interessa se a história que contas é verdade. Quero saber se consegues desapontar outra pessoa para ser autêntico contigo mesmo, se podes suportar a acusação de traição e não traíres a tua alma.

Quero saber se podes ver beleza mesmo que ela não seja bonita todos os dias, e se podes buscar a origem da tua vida na presença de Deus, quero saber se podes viver com o fracasso, teu e meu e ainda, à margem de um lago, gritar para a lua prateada: Posso! Não me interessa onde moras ou quanto dinheiro tens. Quero saber se podes levantar-te após uma noite de sofrimento e desespero, cansado, ferido até aos ossos, e fazer o que tem de ser feito pelos filhos. Não me interessa saber quem és e como vieste parar aqui. Quero saber se ficarás comigo no meio do incêndio e não te acovardarás. Não me interessa saber onde, o quê, ou com quem estudaste. Quero saber o que te sustenta a partir de dentro, quando tudo o mais se desmorona. Quero saber se consegues ficar sozinho contigo mesmo e se, realmente, gostas da companhia que tens nos momentos vazios.

Jean Houston
(em "Paixão Pelo Possível")


sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Budismo, reencarnação e renascimento


Muitas pessoas confundem o budismo com uma doutrina que crê em reencarnação, mas isso não é verdade, porque não existe reencarnação no budismo, não da maneira como se entende reencarnação. Pois não existe nenhuma alma para reencarnar, nenhum espírito, nenhum eu. Há continuidade, mas não de um eu. Somente nosso karma ou nossos impulsos podem permanecer, como movimento que são. E como são movimento, tentarão se manifestar novamente e gerarão um novo ser muito semelhante a nós, com os mesmo desejos e tudo mais, que também olhará para si mesmo e dirá “eu sou”. Este ser até, na infância, pode ter recordações fugazes da existência anterior, mas a perde rapidamente com a idade, chamamos isto, no budismo, de renascimento, em tudo é semelhante ao conceito de reencarnação exceto pelo fato de não haver um eu pessoal que subsiste.
 (Para os que perguntam sobre a tradição dos tulkus no budismo tibetano, o reconhecimento de renascimentos, ela não conflita com este conceito desde que está claro que não se trata de continuidade de um eu, mas sim de continuidade cármica, se houvesse sobrevivência de um eu não se trataria de budismo, pois Buda negou esta possibilidade)
 E porque continua esse ser iludido criando novas identidades vidas após vidas, sem parar, esse ser não passa de um ser cíclico, repetindo sempre os mesmo atos, as mesmas insatisfações, os mesmos desejos e as mesmas tristezas. Como podemos escapar desse ciclo? Somente se mudarmos nossos olhos, os olhos que vêem o mundo. Porque temos olhos de eu, olhamos o mundo como um mundo que age e interage conosco, quando essa interação também é ilusória. Todas as ações e reações das pessoas, todas as coisas que nós temos, todas, são projeções do nosso eu. Nós projetamos nosso eu sobre todas as coisas e as interpretamos de acordo com nosso eu, e este eu é nosso engano. 


Monge Genshô
(postado em seu excelente blog O Pico da Montanha é Onde Estão os Meus Pés)


sábado, 22 de dezembro de 2012

Eu somente não sou cínico com as crianças


Sacrifiquei uma amizade
por uma palavra a mais,
um amor por uma palavra a menos,
uma leitura pela falta de insistência.
Modifico a infância ao avançar.
Esqueço a data ao preencher o cheque.
Uso chapéus dentro de casa.
Deveria ser preso por atravessar
uma praça ensolarada e não sentar.
Atravessar uma vida sem atalhar pela praça.

Eu somente não sou cínico com as crianças.
Mesmo com elas, tenho que me controlar.

Fabrício Carpinejar

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Dramas da vida cotidiana


O que desejamos, o que nos desagrada, o que pensamos, o que sentimos, tudo é impermanente. As palavras de elogio ou de censura são impermanentes. Todas vêm e vão. Se compreendermos isso, não ficaremos tão desnorteados com os dramas da vida cotidiana.

Chagdud Tulku Rinpoche
(em "Sementes de Sabedoria")

sábado, 15 de dezembro de 2012

Basta atenção


Um monge perguntou a seu mestre:
-Qual o caminho mais curto para alcançar a iluminação?
O mestre respondeu:
- Atenção.
O monge insistiu:
- Além disso, o que mais é necessário?
- Atenção, atenção.
- Já sei que a atenção é necessária, mas depois disso o que vem, o que seria mais importante?
- Atenção, atenção, atenção.

Zen

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A agonia de viver do outros


Agora que existem computadores para quase todo o tipo de procura de soluções intelectuais — volto-me então para o meu rico nada interior. E grito: eu sinto, eu sofro, eu me alegro, eu me comovo. Só o meu enigma me interessa. Mais que tudo, me busco no meu grande vazio.Procuro me manter isolada contra a agonia de viver dos outros, e essa agonia que lhes parece um jogo de vida e morte mascara uma outra realidade, tão extraordinária essa verdade que os outros cairiam de espanto diante dela, como num escândalo. Enquanto isso, ora estudam, ora trabalham, ora amam, ora crescem, ora se afanam, ora se alegram, ora se entristecem.

Clarice Lispector
(em "Um Sopro de Vida")

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Nada está oculto


Um monge Zen queixava-se de que o mestre não era claro em seus ensinamentos. Quando passeavam pelo campo num dia de primavera, o aluno disse:
- Que perfume delicioso, o dessas flores!
E o mestre lhe responde:
- Viu como não te escondo nada?

Zen

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Estamos apenas de passagem


Uma vez, há muitos anos, um viajante visitou um sábio monge em sua humilde cabana. Espantado, ele viu que o monge possuía apenas uma mesa, um banco, e alguns livros.
- Mestre, onde estão seus móveis? - perguntou ele.
- Onde estão os seus? - retrucou o mestre.
- Os meus? Eu estou apenas de visita aqui, viajando de passagem.
- Eu também - disse o mestre.

Conto Zen


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

É bela por isso

Para que hei-de chamar minha irmã à água, se ela não é minha irmã?
Para a sentir melhor?
Sinto-a melhor bebendo-a do que chamando-lhe qualquer coisa.
Irmã, ou mãe, ou filha.
A água é a água e é bela por isso.
Se eu lhe chamar minha irmã,
Ao chamar-lhe minha irmã, vejo que o não é
E que se ela é a água o melhor é chamar-lhe água;
Ou, melhor ainda, não lhe chamar coisa nenhuma,
Mas bebê-la, senti-la nos pulsos, olhar para ela
E isto sem nome nenhum.

Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)
(em "Poesia Completa de Alberto Caeiro") 

sábado, 8 de dezembro de 2012

Zen e o mistério que ocorre a cada instante

O Zen se revela na vida mais monótona e entediante do homem simples, na estrada, e que percebe que vive no meio da vida, como a vida é de fato. O Zen nos abre os olhos para o maior mistério, aquele que ocorre diariamente e a cada instante.

Daisetz Teitaro Suzuki

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Atenção a mim, atenção ao outro


Quando dedico atenção a mim mesmo, também o faço com o outro; e dedicando atenção ao outro, eu o faço comigo também.

Buda


quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Se desapegue de si mesmo

Tome consciência de si e de onde você se encontra, então se desapegue de si mesmo; essa é a melhor coisa a fazer.

Mestre Eckhart


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O ordinário da vida


"O ordinário da vida é o extraordinário. E o que a rotina faz com a gente é encobrir essa verdade".

Eliane Brum


sábado, 1 de dezembro de 2012