P.: Como você vê a continuação
dele (Thich Nhat Hanh) em você?
Joanne Friday: Minha
ordenação como instrutora de Dharma é um exemplo claro de como vejo a
transmissão e a continuidade. Eu nunca havia pensado em ser uma instrutora de
Dharma, isso nunca havia passado pelo minha cabeça. Um dia recebi uma carta de
Plum Village me convidando a receber a Transmissão da Lâmpada. Ao ler a carta,
comecei a sentir-me completamente indigna e pensei, "Oh, eles erraram,
certamente meu nome foi confundido com o de outra pessoa", eu estava
realmente atordoada. Passados alguns minutos senti como se houvesse sido
atingida por um raio e pensei: "Isso não tem nada a ver com você."
Desde meu primeiro encontro
com Thay eu o senti muito vivo em cada célula do meu corpo. E o que recebi de
meus pais, de todo mundo que sempre me amou, todo mundo que sempre se importou
comigo, todos eles estão vivos em cada célula do meu corpo. Então, me sentir
incapaz seria como insultar a todos eles. Porque esse convite não dizia
respeito a meu egocentrismo, não tinha nada a ver com meu pequeno eu.
Na preparação para a
cerimônia, minha energia de hábito teria sido tentar chegar com a
palestra-dharma perfeita, para que todos vissem que eu sabia tudo sobre o
Dharma. Mas ao invés disso eu sequer pensei sobre o assunto e não senti
qualquer ponta de ansiedade nos três meses antes da Transmissão da Lâmpada.
Naquela época, como parte da cerimônia, cada novo instrutor proferia uma breve
palestra após sua ordenação. Caminhei lentamente até meu lugar sem ter qualquer
idéia sobre o que dizer, e ainda assim não senti nada além de pura alegria
enquanto pensava, "O que vou dizer?” Então contei a eles a história que
estou contando agora.
Eu disse, "Thay nos
dá um belo ensinamento sobre o não-nascimento e a não-morte usando como exemplo
uma folha de papel. E eu recebi outro profundo ensinamento sobre o
não-self também através de uma folha de
papel. Recebei essa carta pedindo-me para estar aqui e foi essa a minha
experiência, perceber que esse momento deve-se a meus elementos não-self, e não
tem nada a ver comigo. Tem sido muito divertido, sinto muita liberdade. É
realmente incrível. Eu não tenho muita autoconfiança, mas confio totalmente em meu
elementos não-self, e é claro que isso ocorre porque não fiquei nem um pouco
ansiosa. Penso que estou vivenciando a confiança que vem do não-self." E
Thay sorria e todos em volta sorriam.
E assim tem sido desde
então. Se eu for convidada a compartilhar o Dharma, faço o máximo para
manter-me de fora. Meu objetivo em compartilhar o Dharma é transmitir o que me
foi transmitido e deixar meu pequeno eu de fora. E isso nunca me cansa. Mas se
meu ego começa a se manifestar, aí sim eu fico cansada, e esse é um bom sinal
de que preciso ir praticar meditação-andando e sair do caminho.
Joanne Friday
(mestre de Dharma ordenada por Thich Nhat Hanh, em
entrevista à revista budista Mindness Bell")