Chegaram aos ouvidos do príncipe Takayasu os comentários de
que mestre Kendó, uma das maiores figuras espirituais anteriores a era Meiji
(1868), deleitava-se com suntuosas ceias após todos terem adormecido.
Na noite seguinte o príncipe, mesmo sendo um profundo
admirador de Kendó, escondeu-se no jardim e viu que realmente o mestre comia
sozinho em sua cabana. Ingignado, Takayasu pulou de súbito a janela, e o
mestre, surpreendido, cobriu com rapidez sua tigeja.
- O que você está escondendo? - perguntou o príncipe.
O mestre pediu para que ele esquecesse o assunto e não
insistisse, mas quando o príncipe fez menção de tomar a tigela, Kendó a
descobriu e mostrou seu conteúdo, dizendo:
- Me envergonha muito de que isso tenha chegado aos ouvidos
de Sua Alteza. Há aqui muitos monjes estudantes vindo dos mais diversos lugares
do país, e apesar de eu sempre insistir para que não desperdicem uma gota de
água sequer e nem joguem fora sobras de legumes e arroz, continuam jogando os
talos e tudo o mais pelo ralo. Para evitar esse desperdício, coloquei uma
pequena rede dentro do ralo, e quando todos dormem recolho o que o que ficou
retido ali, fervo, e aproveito como ceia. Faço isso há muitos anos. Lamento
profundamente que uma história tão sórdida venha a incomodar teus nobres ouvidos.
(Citado por Irmgard
Schloegl em "La Sabiduria do Zen")
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