quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Sobre a Culpa




Pema Chödrön: Rinpoche, como você já vive na América do Norte há algum tempo e conhece bem a mente e a cultura ocidentais, na sua opinião, qual é o conselho mais útil que se pode dar aos estudantes do dharma aqui?

Ven. Dzigar Kongtrul Rinpoche: A coisa mais importante que eu percebo que os alunos ocidentais precisam compreender é a ausência de culpa.

PC: Ausência de culpa?

VDKR: Sim, ausência de culpa. Eles precisam compreender que uma pessoa ou a sua mente é inocente por natureza.

PC: Pode explicar o que quer dizer com “inocente”?

VDKR: Quero dizer que, do ponto de vista do budismo, podemos entender que tudo o que fazemos de mal a nós mesmos e aos outros tem origem em confusões e ignorância profundamente enraizadas, mas que a mente é naturalmente pura e iluminada. Quando sentimos uma culpa muito grande, nos esquecemos dessa perspectiva.

PC: Acho que às vezes os alunos ocidentais têm dificuldade de acreditar nessa perspectiva.

VDKR: O fato de que todos os seres sencientes desejam a felicidade e a liberdade prova que a natureza de suas mentes é pura e inocente.

PC: Mas, aparentemente, nós nos identificamos mais com o “nosso lado mau” do que com a pureza e a inocência.

VDKR: Essa noção de um “lado mau” vem da não compreensão da ideia de ausência de eu que é tão central ao caminho budista. A compreensão de que não existe um “eu” sólido, singular ou permanente torna possível acolhermos o que quer que surja na vida sem nos sentirmos tão intimidados pela nossa experiência, sem nos rendermos como um cão derrotado em uma briga. Podemos perceber que as coisas surgem devido ao nosso carma que se desdobra, e isso não tem necessariamente que ser algo tão pessoal. Assim, podemos nos identificar com algo maior – que é a nossa própria natureza. Dessa perspectiva, como não existe um eu sólido, singular, permanente, não há um eu “do mal” pelo qual sentir culpa. A mente é inocente, mas é influenciada pela ignorância e por crenças conceituais equivocadas que projetam um eu. Mas não existe um eu.

PC: Então, como podemos compreender a ausência de eu?

VDKR: A mente possui uma inteligência inata, e essa inteligência pode ser cultivada, a fim de que possamos compreender a ausência de eu, que é o oposto desse “eu” projetado. Essa é a nossa verdadeira natureza.



(Conversa entre Pema Chodron e Dzigar Kongtrul Rinpoche – Publicado originalmente na Revista Tricycle. Tradução de Lilian Moreira Mendes. Retirado do site Buda Virtual)



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