sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Autorreflexão




Pema Chodron: Um dos aspectos mais importantes de um mestre é apontar aquilo que os alunos não conseguem ver. Como você lida com isso quando os alunos têm tanta dificuldade em enxergar as próprias falhas?

Ven. Dzigar Kongtrul Rinpoche: É uma boa pergunta. Afinal, nada de significativo acontece realmente dentro da prática ou na relação entre aluno e mestre até que o aluno esteja pronto para enxergar suas falhas sem sentir uma grande culpa. O aluno é um praticante na medida em que deseja fazer isso. Quando um mestre aponta suas regiões sombrias e ocultas, está se dirigindo à ignorância e expondo-a para o bem do aluno, e não para reforçar a noção de um eu intrinsecamente mau. Mas o mestre também precisa ter consciência da verdadeira identidade do aluno. O mestre também aponta a natureza básica do aluno para que este possa se identificar com sua própria bondade, e não com a culpa ou com uma atitude defensiva. Dessa forma, existe muita abertura para olhar para os cantos escondidos, que são, na verdade, fugazes e temporários. Tanto o aluno quanto o mestre devem ter consciência dos pontos cegos do aluno e de sua natureza búdica.

PC: Então a disposição para a autorreflexão parece ser o segredo aqui.

VDKR: A disposição para a autorreflexão aliada à visão mais ampla da ausência de eu, o que de fato torna possível olhar. Quando conseguimos fazer isso, no fim das contas, nos tornamos muito mais despreocupados, nos livramos da resistência.

PC: Resistência?


VDKR: Sim, a resistência é a culpa – não querer olhar. Com a visão da ausência de culpa, podemos trabalhar com o certo ou o errado, com o que fizemos ou não fizemos. Não importa. Podemos nos sentir livres para trabalhar com essa situação sem opor resistência. A mente fica mais ágil porque há mais espaço – espaço para olhar sem se sentir ameaçada. Quando surge a culpa, ela dá mais força a esse sentimento de um “lado mau” intrínseco. Isso não é útil nem verdadeiro e contraria a forma como as coisas são. Se apresentamos a visão da ausência de ego para a nossa culpa, rompe-se a parte profunda do nosso apego emocional a esse “lado mau” intrínseco. Estou certo de que a compreensão da ausência de culpa e da ausência de eu é muito útil para todos os praticantes.


(Conversa entre Pema Chodron e Dzigar Kongtrul Rinpoche – Publicado originalmente na Revista Tricycle. Tradução de Lilian Moreira Mendes. Retirado do site Buda Virtual)



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