Pema Chodron: Um dos aspectos mais importantes de um mestre
é apontar aquilo que os alunos não conseguem ver. Como você lida com isso
quando os alunos têm tanta dificuldade em enxergar as próprias falhas?
Ven. Dzigar Kongtrul Rinpoche: É uma boa pergunta. Afinal,
nada de significativo acontece realmente dentro da prática ou na relação entre
aluno e mestre até que o aluno esteja pronto para enxergar suas falhas sem
sentir uma grande culpa. O aluno é um praticante na medida em que deseja fazer
isso. Quando um mestre aponta suas regiões sombrias e ocultas, está se
dirigindo à ignorância e expondo-a para o bem do aluno, e não para reforçar a
noção de um eu intrinsecamente mau. Mas o mestre também precisa ter consciência
da verdadeira identidade do aluno. O mestre também aponta a natureza básica do
aluno para que este possa se identificar com sua própria bondade, e não com a
culpa ou com uma atitude defensiva. Dessa forma, existe muita abertura para
olhar para os cantos escondidos, que são, na verdade, fugazes e temporários.
Tanto o aluno quanto o mestre devem ter consciência dos pontos cegos do aluno e
de sua natureza búdica.
PC: Então a disposição para a autorreflexão parece ser o
segredo aqui.
VDKR: A disposição para a autorreflexão aliada à visão mais
ampla da ausência de eu, o que de fato torna possível olhar. Quando conseguimos
fazer isso, no fim das contas, nos tornamos muito mais despreocupados, nos
livramos da resistência.
PC: Resistência?
VDKR: Sim, a resistência é a culpa – não querer olhar. Com
a visão da ausência de culpa, podemos trabalhar com o certo ou o errado, com o
que fizemos ou não fizemos. Não importa. Podemos nos sentir livres para
trabalhar com essa situação sem opor resistência. A mente fica mais ágil porque
há mais espaço – espaço para olhar sem se sentir ameaçada. Quando surge a
culpa, ela dá mais força a esse sentimento de um “lado mau” intrínseco. Isso
não é útil nem verdadeiro e contraria a forma como as coisas são. Se
apresentamos a visão da ausência de ego para a nossa culpa, rompe-se a parte
profunda do nosso apego emocional a esse “lado mau” intrínseco. Estou certo de
que a compreensão da ausência de culpa e da ausência de eu é muito útil para
todos os praticantes.
(Conversa entre Pema
Chodron e Dzigar Kongtrul Rinpoche – Publicado originalmente na Revista
Tricycle. Tradução de Lilian Moreira Mendes. Retirado do site Buda Virtual)
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