terça-feira, 23 de agosto de 2016

Nossa ilusória identidade




Nossa identidade, que parece tão confiável, tão concreta, na verdade é muito fluida, muito dinâmica. As possibilidades do que pensamos e sentimos e o modo pelo qual podemos experimentar a realidade são ilimitados. Temos o que é necessário para nos libertar do sofrimento de uma identidade fixa e nos conectar com a natureza fugidia e misteriosa do nosso ser, que não tem identidade fixa. Seu senso de você mesmo – de quem pensa que é no nível relativo – é uma versão muito restrita de quem realmente é.

Mas a boa nova é que sua experiência imediata – quem você parece ser nesse momento preciso – pode ser usada como entrada para sua verdadeira natureza. Por meio do pleno envolvimento com esse instante relativo do tempo – o som que ouve, o cheiro que sente, a dor ou conforto que sente agora – estando totalmente presente em sua experiência, você entra em contato com a abertura ilimitada do seu ser. Todos os nossos padrões habituais são esforços para manter uma identidade previsível: “ Sou uma pessoa raivosa”; “Sou uma pessoa amistosa”; “sou um verme”. Podemos trabalhar com esses hábitos mentais quando eles surgem e ficam com nossa experiência, não só quando estamos meditando, mas também no cotidiano. Estejamos a sós ou na companhia de outros, não importa o que estejamos fazendo, a inquietude pode vir para a superfície a qualquer instante. Podemos achar que esses sentimentos pungentes, penetrantes, sejam sinais de perigo, mas na verdade são sinais de que acabamos de entrar em contato com a fluidez essencial da vida. Ao invés de nos escondermos desses sentimentos, ficando na bolha do ego, podemos deixar passar a verdade de como as coisas realmente são. Esses momentos são grandes oportunidades. Mesmo que estejamos cercados de gente – numa reunião de negócios, digamos – ao sentirmos a inquietude surgindo, podemos simplesmente respirar e encarar os sentimentos. Não é preciso entrar em pânico e nos fecharmos em nós mesmos. Não é preciso reagir do modo habitual. Não é preciso lutar ou fugir. Podemos ficar envolvidos com os outros e ao mesmo tempo reconhecer o que estamos sentindo.


Pema Chodron
(em “A Beleza da Vida”)

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