quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O Darma não é uma terapia

Práticas budistas são técnicas que usamos para lidar com nosso auto-acariciamento habitual. Cada uma é projetada para atacar hábitos individuais até que a compulsão de se agarrar a um “eu” seja completamente erradicada. Então, embora uma prática possa parecer budista, se ela reforça o apego a si, na verdade é muito mais perigosa que qualquer prática abertamente não-budista.

O objetivo de um número excessivo de ensinamentos hoje em dia é fazer as pessoas “se sentirem bem”; alguns mestres budistas estão até começando a soar como apóstolos New Age. Suas palestras são inteiramente voltadas para validar as manifestações do ego e apoiar a “nobreza” de nossos sentimentos, coisas que não têm nada a ver com os ensinamentos que encontramos nas instruções essenciais.

Então, se você está preocupado apenas em sentir-se bem, será muito melhor receber uma massagem corporal completa ou ouvir alguma música enaltecedora, ou do tipo “viva a vida!”, do que receber ensinamentos do darma — que definitivamente não foram projetados para te animar. Pelo contrário, o darma foi tramado especificamente para expor suas falhas e fazer você sentir-se horrível.

Para Kongtrul Rinpoche, quando um praticante para de considerar uma grande coisa aquilo que costumava dar muito importância o tempo todo, esse é um sinal de que a prática do darma está dando frutos. Por exemplo, antes de se tornar um genuíno praticante, receber um elogio sobre seu cabelo iria te intoxicar de deleite, enquanto a mera sugestão de que ele estava um pouco menos que perfeito imediatamente te jogaria na espiral descendente da depressão.

Nem chegar a reagir em qualquer uma das situações é um sinal de que a prática está dando frutos e que você está se tornando um praticante autêntico do darma, e isso é muito melhor do que ter um milhão de elogios, sonhos encorajadores ou sensações de êxtase.

É um grande erro pressupor que praticar o darma irá nos ajudar a acalmar e a levar uma vida sem problemas; nada poderia estar mais distante da verdade. Darma não é uma terapia. É bem o oposto na verdade: o darma é algo sob medida para virar sua vida de cabeça para baixo — é justamente isso que você encomendou.

Então, quando sua vida sai completamente do planejado, por que você reclama? Se sua prática e sua vida não capotarem, esse é um sinal de que o que você está fazendo não está funcionando.

É isso que distingue o darma de métodos New Age envolvendo auras, relacionamentos, comunicação, bem-estar, a Criança Interior, ser um com o universo e abraçar árvores. Do ponto de vista do darma, tais interesses são os brinquedos de seres samsáricos — brinquedos que rapidamente nos entediam até a letargia.

Dzongsar Khyentse Rinpoche


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