“Os pavões comem veneno
e o veneno que eles comem é transformado em belas penas.”
Tendo passado a maior parte da minha infância preso em uma pequena bolha de medo e ansiedade, sei como as aflições mentais podem ser fortes. Passei 13 anos pensando que morreria – e algumas vezes desejando morrer só para me livrar do medo que sentia. Depois que entrei no retiro e precisei encarar essas aflições, aprendi que a ignorância, o apego e a aversão constituíam o material que me foi dado trabalhar, que, como o veneno que os pavões comem, acabaram revelando-se fonte de uma grande benção.
Cada aflição mental é, na verdade, a base da sabedoria. Se
ficarmos presos a nossas aflições ou tentarmos reprimi-las, acabaremos criando
mais problemas para nós mesmos. Se, em vez disso, olharmos diretamente para
elas, as coisas que achamos que nos matarão aos poucos se transformam nos
suportes mais poderosos para a meditação que jamais poderíamos imaginar.
As aflições mentais não são nossas inimigas. Elas são
nossas aliadas.
E esta é uma verdade difícil de aceitar. Mas, a cada vez
que você sentir um impulso de fugir delas, pense no pavão. O veneno não tem um
sabor muito bom. Mas, se você o engolir, ele se transforma em beleza.
À medida que analisamos essas práticas, passamos a
reconhecer que o nível no qual qualquer experiência repele, assusta ou parece
nos enfraquecer é igual ao nível no qual as mesmas experiências podem nos
tornar mais fortes, confiantes, abertos e capazes de aceitar as infinitas
possibilidades de nossa natureza búdica.
Yongey Mingyur Rinpoche
(em “Alegria de Viver”)